Decisão do CEO Alexandre Bompard impacta mercado francês, mas não altera os negócios da empresa no Brasil
O CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, declarou nesta quarta-feira (20) que a rede de varejo francesa se compromete a não comercializar mais carne proveniente do Mercosul, que inclui Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. A medida foi comunicada por meio de uma carta direcionada ao presidente do sindicato agrícola francês FNSEA e também compartilhada em suas redes sociais. No entanto, o Grupo Carrefour Brasil afirmou que a decisão não afetará as operações no Brasil, onde continuará a comercializar carne proveniente de frigoríficos locais.
A declaração de Bompard ocorre em meio a uma crescente pressão na França sobre o acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul, com protestos de agricultores franceses, que alegam que a carne do Mercosul não atende aos padrões exigidos pelo mercado francês. Em sua carta, Bompard afirmou: “No Carrefour, estamos prontos, qualquer que seja o preço e a quantidade de carne que o Mercosul venha a nos oferecer”. O CEO também fez um apelo para que outros setores do mercado agroalimentar se unam à iniciativa, destacando a importância de garantir que a carne comercializada na França respeite os critérios locais.
Nota do Carrefour sobre as Operações no Brasil
Em nota o Grupo Carrefour Brasil destacou que “nada muda” nas operações no Brasil. A empresa explicou que a decisão do CEO se aplica exclusivamente às lojas da rede na França, e que no restante do mundo, incluindo o Brasil e a Argentina, as unidades continuarão a comercializar carne proveniente do Mercosul. O grupo não detalhou o volume de carne importada do Mercosul ou do Brasil para seus mercados internacionais.
A posição do Carrefour gerou reações no setor agropecuário. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) lamentou a decisão e criticou o posicionamento de Bompard, considerando-o contraditório, já que a empresa opera cerca de 1.200 lojas no Brasil, abastecidas em grande parte com carne brasileira. A Abiec também apontou que a medida pode prejudicar o próprio negócio, pois a produção de carne brasileira não seria suficiente para atender à demanda interna da rede.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) também se manifestou, considerando os argumentos do CEO franceses como “equivocados” e afirmando que as carnes produzidas pelos países do Mercosul atendem aos critérios exigidos pelos mercados internacionais. Para a ABPA, a postura do Carrefour é uma tentativa de proteger interesses locais em detrimento da transparência e da qualidade das carnes do Mercosul.
Ministério da Agricultura Rechaça Declarações
Em resposta à declaração de Bompard, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) emitiu uma nota destacando a qualidade e o compromisso da agropecuária brasileira com a legislação e as boas práticas agrícolas. O Mapa afirmou que o Brasil mantém um rigoroso sistema de defesa agropecuária e que as carnes produzidas no país atendem aos mais altos padrões de qualidade, incluindo os exigidos pela União Europeia. A pasta também destacou que o Brasil tem se esforçado para implementar modelos eletrônicos que atendem aos requisitos de rastreabilidade da União Europeia, reforçando o compromisso do país com a transparência e sustentabilidade da sua produção agropecuária.
A declaração do CEO do Carrefour ocorre quase um mês depois de uma polêmica envolvendo a Danone, outra gigante francesa. Em outubro, a empresa de laticínios afirmou que havia interrompido a importação de soja brasileira, o que gerou confusão e declarações contraditórias entre as lideranças da empresa. A controvérsia também esteve relacionada ao contexto da legislação da União Europeia, que tem o objetivo de proibir a importação de produtos provenientes de áreas desmatadas, medida que deverá entrar em vigor em 2025.
Comunicado Completo do Carrefour
O Carrefour publicou, em suas redes sociais e na carta enviada ao sindicato FNSEA, o seguinte comunicado na íntegra:
“Em toda a França, ouvimos o desespero e a indignação dos agricultores diante do projeto de acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul e o risco de inundação do mercado francês com carne que não atende às suas exigências e normas. Em resposta a essa preocupação, o Carrefour quer agir em conjunto com o setor agrícola e assume hoje o compromisso de não comercializar nenhuma carne proveniente do Mercosul. Esperamos inspirar outros atores do setor agroalimentar e impulsionar um movimento mais amplo de solidariedade, além do papel da distribuição, que já lidera a luta em favor da origem francesa da carne que comercializa. Faço um apelo especial aos atores da restauração fora de casa, que representam mais de 30% do consumo de carne na França – mas onde 60% é importada – para que se unam a esse compromisso. Somente unidos poderemos garantir aos pecuaristas franceses que não haverá nenhuma possibilidade de contornar essa questão. No Carrefour, estamos prontos, qualquer que seja o preço e a quantidade de carne que o Mercosul venha a nos oferecer.”
Nota Completa do Ministério da Agricultura
O Ministério da Agricultura e Pecuária também divulgou a seguinte nota em resposta às declarações de Bompard:
“O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) reitera a qualidade e compromisso da agropecuária brasileira com a legislação e as boas práticas agrícolas, em consonância com as diretrizes internacionais. Diante disso, rechaça as declarações do CEO do Carrefour, Alexandre Bompard, quanto às carnes produzidas pelos países do Mercosul. O Brasil possui uma das legislações ambientais mais rigorosas do mundo e atua com transparência no setor, apresentando à União Europeia propostas de modelos eletrônicos que contemplam as etapas iniciais do Regulamento de Desmatamento da União Europeia (EUDR), demonstrando compromisso com uma produção rastreável e transparente, sendo que os modelos privados de rastreabilidade são amplamente reconhecidos e aprovados pelos mercados europeus.”
Este posicionamento do Carrefour, somado às reações de autoridades e representantes do setor agropecuário brasileiro, reflete o impacto de decisões empresariais globais sobre o comércio e a imagem da carne brasileira no exterior.