Segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) que precisam requerer o benefício por incapacidade temporária (o antigo auxílio-doença) poderão em breve fazer o pedido e entregar o atestado médico em agências dos Correios.
A abertura do novo canal de atendimento faz parte da estratégia do órgão de ampliar o uso do Atestmed, sistema online que dispensa a perícia presencial. O presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, diz que o objetivo é conceder 100% dos benefícios por incapacidade por meio do Atestmed até 30 de abril.
“Para que a gente possa chegar a 100%, nós estamos já em contato bastante avançado com os Correios para que o Atestmed seja também requerido ou complementado nos Correios, porque nós temos ainda uma parte da população que é excluída digitalmente”, afirma à Folha.
Os testes devem começar com um piloto em Fortaleza a partir de 18 de março, mas a ideia é expandir o modelo para nível nacional. O segurado terá duas opções. A primeira é ir direto à agência dos Correios, onde um funcionário fará o pedido e digitalizará o atestado médico. Segundo Stefanutto, a ideia é que esse atendimento não precise ser agendado —diferentemente da ida às agências próprias do INSS.
Outra alternativa é iniciar o requerimento por meio da central telefônica 135 e ir à agência dos Correios apenas para apresentar o atestado médico para complementar a solicitação. “A pessoa vai trazer só o atestado e eles [funcionários dos Correios] vão fazer o requerimento, ou a pessoa vai poder fazer o requerimento no 135 e depois só leva o atestado nos Correios. Nós vamos deixar bastante amplo, para que a população não tenha nenhuma dificuldade. Vai ser uma mudança feita de forma gradual, ninguém vai virar a chave do dia para a noite”, diz Stefanutto.
Na prática, a medida vai acabar com a possibilidade de um segurado requerer exame médico presencial para casos de incapacidade temporária. O argumento do governo é que isso libera a força de trabalho dos peritos para outras análises, como requerimentos de BPC (Benefício de Prestação Continuada) ou revisão periódica de outros benefícios.
Além disso, o Executivo diz observar uma economia de recursos com o uso mais intensivo do Atestmed, já que a maior agilidade nas avaliações minimiza o risco de pagar o benefício durante mais tempo só porque houve demora na análise, independentemente de o segurado já ter se recuperado.
O sistema permite fazer a solicitação pelo aplicativo ou site Meu INSS e apresentar o atestado médico em formato digital, sem sair de casa. O INSS faz a análise de conformidade dos documentos e, se estiver tudo certo, concede o benefício. No ano passado, o Atestmed foi usado em 30% a 40% dos requerimentos de benefício por incapacidade temporária. Em dezembro, esse percentual chegou a quase 50%, segundo Stefanutto.
“Como estava em dezembro, nós economizamos R$ 170 milhões. No momento que eu dobro isso [para chegar a 100% pelo sistema digital], devemos chegar a uma economia de R$ 350 milhões a R$ 400 milhões por mês”, diz o presidente do INSS. No ano, o órgão projeta um ganho próximo a R$ 5 bilhões com o uso da tecnologia.
A principal barreira para a expansão do uso da ferramenta é a pouca familiaridade dos segurados com o ambiente digital. “Eu não posso, para economizar mais dinheiro, obrigar [a usar o Atestmed por conta própria] ou deixar a pessoa sem benefício”, diz o presidente do INSS.
“Quando a gente fechar a possibilidade de fazer a perícia presencial e exigir que só faça por atestado, tenho que ter multicanais para que as pessoas possam levar seu atestado. Aquela pessoa que não tem como tirar uma foto no celular, não tem celular, [que ela] possa fazer o requerimento, sendo uma agência nossa, mas principalmente os Correios, porque os Correios têm uma rede muito grande”, acrescenta.
A aposta do governo é no ganho de capilaridade. O INSS tem cerca de 1.600 agências em todo o país, enquanto os Correios têm cerca de 11 mil unidades, das quais quase 7.000 são agências próprias (as demais são terceirizadas). A implementação da teleperícia tem sofrido resistência dos peritos, que afirmam haver parecer do conselho federal da categoria contrário à medida.
Stefanutto, no entanto, já disse em outras ocasiões não haver nada que justifique forçar um segurado a andar quilômetros para fazer uma perícia presencial quando é possível realizar consultas online.
O instituto também está usando a inteligência artificial e a análise de dados para evitar fraudes. Todos os pedidos estão alimentando um banco de dados com milhões de atestados, a partir dos quais é possível cruzar informações sobre os médicos, como em qual hospital trabalham e se o número do registro no conselho de medicina, de fato, é daquele profissional.
O INSS já detectou casos de diferentes assinaturas para um mesmo profissional, o que ajudou a evitar a concessão de um benefício indevido. Se por um lado a implementação da perícia online contribuiu para reduzir o estoque de agendamentos pendentes (de 1,2 milhão em setembro de 2023 para 880 mil em janeiro de 2024), por outro a análise mais célere também impulsionou o número de concessões e, consequentemente, dos gastos no curto prazo.
Stefanutto argumenta que os benefícios concedidos representam apenas a regularização do fluxo de pagamentos que já teriam de ser feitos no futuro, inclusive com aplicação de juros e correção monetária. Mas ele reconhece que a medida acaba gerando um maior crescimento da folha —que pressiona as despesas.
Só em dezembro passado, o INSS concedeu 240 mil novos benefícios por incapacidade temporária, 56,8% a mais do que em igual mês de 2022. Ele destaca também que a folha de pagamento da Previdência é influenciada pela correção monetária dos benefícios, bem como pelo crescimento vegetativo via concessão de outros benefícios.
“A economia [esperada com as medidas] não é suficiente para derrubar o crescimento vegetativo da folha”, reconhece. Além do Atestmed, o INSS pretende adotar outras medidas para ajudar na contenção de despesas. Uma delas é ampliar a integração de dados com bases dos estados, como do Detran. O órgão também quer investir em tecnologia para melhorar a prevenção, detecção e contenção de fraudes decorrentes de “incidentes cibernéticos”. A estimativa é poupar pelo menos R$ 1,2 bilhão com essa iniciativa.