A Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) e a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) precisam colocar em prática uma força-tarefa, nos próximos meses, para permitir que todo brasileiro classificado a Paris no atletismo tenha direito de ser inscrito. Se as Olimpíadas fossem nesta quarta-feira (13), a maioria deles seria inelegível.

Na segunda (11), a World Athetlics (WA) anunciou que aceitou recomendação da Athletics Integrity Unit (AIU), que cuida do antidoping no atletismo, e impôs que atletas de quatro países, entre eles o Brasil, só sejam elegíveis para participar de Paris-2024 se passarem por três testes surpresa nos 10 meses que antecedem à Olimpíada.

Ao menos um desses testes precisa ser até 19 de maio. E atletas de provas longas (acima de 800m) têm que passar por ao menos um teste de sangue, para avaliação do chamado passaporte biológico e com teste de EPO. Por enquanto, o número de testes já realizados é baixo, e não chega a 30% do necessário.

“Estabelecemos três grupos prioritários. A prioridade máxima é de quem já está classificado. Depois, quem está na zona de classificação do Road to Paris [o ranking olímpico do atletismo]. E tem um terceiro grupo, que é quem está fora e pode entrar. Mas esse cara não é nem nossa prioridade A, nem a prioridade B”, explica Claudio Castilho, CEO da CBAt.

Adriana Taboza, presidente da ABCD, afirma que a entidade apoia a medida. “Os atletas do grupo alvo de teste da ABCD passam por três testes fora de competição em 12 meses. Essa é uma exigência determinada pela AMA-WADA [Agência Mundial Antidoping]. O que a WA sugere é algum ajuste que, a princípio, é possível executar. Toda medida que visa proteger o esporte, a despeito de ser uma exigência da Agência Mundial ou não, receberá o apoio da ABCD e nosso propósito é concluir essa ação em parceria com a WA e com CBAt”, diz ela, que está na Suíça para o simpósio anual da Wada.

PUNIÇÃO AO BRASIL

A AIU tem cobrado a CBAt desde 2022 pela baixa frequência de testes surpresa entre os atletas brasileiros. No Mundial de 2023, constatou que os brasileiros chegaram a Budapeste tendo passado por ainda menos exames, em média, do que no ciclo anterior. Daí veio a nova exigência, que também vale para Equador, Peru e Portugal.

Mas quem tem responsabilidade sobre esses testes é a ABCD, um órgão de governo, que tem orçamento limitado para cuidar de todas as modalidades, não só as olímpicas e paralímpicas.

CBAt e ABCD, e mais recentemente também o COB, têm tido reuniões regulares para solucionar o problema, inclusive com divisão de custos. Uma saída é aproveitar momentos em que seleções estão reunidas para testar vários atletas de uma vez. Já foi assim na véspera do embarque para o Mundial Indoor de Glasgow (Escócia), quando 16 brasileiros passaram por testes.

A ABCD, porém, só pode fazer testes em solo brasileiro, e diversos atletas do país treinam e competem no exterior. A agência tem convênios com os órgãos equivalentes de alguns países, como EUA (onde vive Alison dos Santos) e Portugal (Almir Jr e Letícia Oro estão lá). Mas não com o Quênia, país onde reside o maratonista Daniel Nascimento. No caso dele, a tendência é que os testes ocorram quando ele viajar para competir – pretende disputar a Meia de Lisboa e a Maratona de Londres.

DELEGAÇÕES GRANDES DEMAIS

A CBAt reconhece que o número de exames não é o ideal, mas argumenta que a World Athletics tem distribuído vagas de última hora, o que faz a delegação aumentar exponencialmente na véspera das competições.

“Na quarta-feira antes do Mundial [Indoor] de Glasgow, à tarde, a gente tinha nove atletas classificados. No mesmo dia subiu para 21. Como você vai criar um radar, controlar, se o Mundial de Budapeste eles chamaram até quem estava acima de 400 do ranking mundial, como aconteceu na maratona feminina? Isso inclusive gera um custo altíssimo para gente. Imagina quanto eu paguei em passagens para Glasgow com quatro dias de antecedência”, questiona Castilho.

A ampliação no tamanho das delegações também altera o número de atletas que a WA entende existir no Brasil, e consequentemente o volume de testes exigidos. “O que pode estar causando a divergência na alegação da WA é o que eles consideram como atletas de alto desempenho. Os testes fora de competição da ABCD são direcionados a atletas nacionais relevantes ou em situação determinada por informação de inteligência e investigação”, explica Adriana.

O período de classificação para a Olimpíada termina, na maioria das provas, no fim de junho. A lista de classificados deve sair em 3 de julho, mas ela costuma rodar bastante. Diferente do Brasil, vários países impõem critérios mais rígidos do que o ranking da World Athletics. Assim, a tendência é que novas vagas caiam no colo dos brasileiros durante as primeiras semanas de julho.

Até a última atualização do Road to Paris, o Brasil tinha 42 atletas na zona de classificação ou com índice, sendo três deles em duas provas. Um grupo de 20 a 25 atletas, na análise do blog, estão em posição no ranking que os permitem ainda sonhar com a Olimpíada. Além disso, o Brasil vai buscar vagas nos revezamentos. Em cada um deles, o time seria composto por seis atletas.

E é aí que reside o maior risco. Em 2022, Gabriel Garcia, um guia paralímpico que nunca havia nem disputado um Troféu Brasil, atingiu critério para entrar no 4x100m no final de junho. Se uma surpresa do tipo acontecer em 2024, o atleta ficará fora da Olimpíada.

“O risco existe, porque um resultado fora do contexto, do mesmo lado que pode trazer uma baita alegria, pode não adiantar nada, porque se não foram feitos os controles é muito complicado. Por isso fazemos atualização do grupo alvo toda semana. Nossa expectativa é que o camping pré-Mundial de Revezamentos agregue muitos atletas, e isso permita que muita gente também seja testada”, adianta Castilho.

 

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